terça-feira, 18 de junho de 2013

Brecht,

Brecht, e o teatro da revolta
Quando Bertolt Brecht morreu, em Berlim no dia 14 de agosto de 1956, diversos intelectuais alemães ocidentais, entre eles Günther Grass, criticaram-lhe o mutismo quando do levante operário anti-soviético de 1953. Cobraram-lhe uma atitude mais coerente com sua obra. Ele, afinal, ao longo de mais de trinta anos de ação como dramaturgo e poeta, sempre se batera pelo proletariado, coisa que não ocorreu quando os habitantes de Berlim oriental insurgiram-se contra os tanques do Exército Vermelho. Brecht definitivamente envelhecera, concluíram então.


Os loucos anos vinte em Berlim


       B.Brecht (1898-1956)
Nascido Eugen Berthold Friederich Brecht, em 10 de fevereiro de 1898, rebento de uma família da burguesia suábia relativamente próspera, na cidade de Augusburg, no Reino da Bavária, então na órbita do IIº Reich, os amargores coletivos provocados pela derrota alemã na Primeira Guerra Mundial jogaram-no, como a tantos outros jovens zangados, nos braços do inconformismo e do radicalismo ideológico. Brecht, quando estudante de medicina, servindo num lazareto militar, chegou a integrar os conselhos revolucionários que se formaram logo que o império do Kaiser Guilherme II entrou em colapso. A partir de 9 de novembro de 1918, o Velho Regime fora abaixo com notável rapidez, sendo substituído, ainda que transitoriamente, pela Räterepublik, uma República de Conselhos (no molde dos sovietes russos de 1905 e de 1917 ou ainda na Comuna de Paris, de 1871).
Em pouco tempo a Alemanha mergulhou num caos com levantes ocorrendo em todos os lados, nos quais as milícias da revolução, formadas por soldados, marinheiros e operários, eram reprimidas pelos corpos francos formados por ex-combatentes e seus oficiais. Foi por essa ocasião que Brecht, então com 22 anos, empenhou-se em visitar Berlim para tentar uma carreira no meio teatral. Foi um desastre. Era difícil encontrar pão e trabalho numa cidade convulsionada pelos choques políticos, em meio a uma multidão de desempregados e soldados desmobilizados, furiosos e famintos. Um ar pesado de sangue e pólvora dominava as ruas da metrópole.
Todavia o desabamento do Reich, se mergulhou a nação alemã no caos, instigou os artistas da época a buscar novas formas de expressão. Deu-se por então o apogeu do expressionismo com suas imagens propositadamente entortadas, seu mundo sombrio e cinzento, suas figuras torturadas em meio às paisagens desoladoras. Era a mais autêntica estética da desordem. Nos quadros de Otto Dix e George Grosz a pessoa humana dava lugar à caricatura, paralelamente ao momento em que magos malignos ("Das Kabinett des Doktor Caligari", de Robert Wiene, 1920), e vampiros ("Nosferatu", de Murnau, 1922) tomavam conta das telas.
Ao tempo em que tudo parecia afundar, em Berlim, em plena sintonia com o nome de um dos bares famosos da época, o Zur letzten Instantz ("A derradeira instância"), as casas de diversão enchiam-se com boêmios dispostos a gastar seus minutos como se fossem os últimos que gozariam na vida. O jazz, o charleston e o tango, o trompete, o piano e o bandônion, tocados até o amanhecer, rivalizavam-se na conquista do gosto dos bailarinos e dos infatigáveis pares dançantes dos incontáveis salões que se estendiam da Friedrichstrasse até a feérica Kurfürsterdamm. Os teatros populares, o Varieté ou o vaudeville, instalados em enormes espaços para diversões, como no Wintergarten ou no Scala, atraíam multidões que, por alguns centavos, mergulhavam numa névoa de fumaça de tabaco e torpor alcoólico, embalados por bandas de todos os tipos.
A inovação e o escândalo, a revolução e a reação, disputavam cada milímetro das atividades culturais do país, a vida noturna da grande metrópole parecia desafiar qualquer descrição. A ex-sóbria capital do Reich se tornou o reino do exagero, do pansexualismo e da audácia estética. A impressão que se tinha é que na República de Weimar "a moralidade estava suspensa", era um vale-tudo. Parecia que os alemães haviam perdido não só a guerra mas também o bom senso das coisas. (*)

(*) De certo modo pode entender-se a ópera dele Aufstieg und Fall der Stadt Mahagonny, "Ascenção e queda do estado Mahagonny", estreada em Leipzig, em 1930, um tanto antes da ascensão do nazismo, como uma caricatura da Berlim do seu tempo, a sociedade em que os prazeres pareciam não ter mais fim: o vaudeville permanente em que ela se transformara.

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